CLUBE DAS PESSOAS
que se juntam para comemorar
por Joana Costa & Mariana Leão
E-mail: Querido Rogério, faz já algum tempo desde que visitaste a nossa casa. Desde aí muita coisa mudou. Conhecemo-nos num período de mudanças e isso nunca se esquece. Nessa noite, escreveste em papel vermelho e colocaste numa das janelas onde jantávamos: "Clube das pessoas que se juntam para comemorar (jantar semanal)". Essa casa, esse local, essas pessoas, esse jantar, evocam memórias. E é à luz dessas lembranças que te escrevemos este texto. Sabemos que, se hoje ele é escrito desta forma, é porque muitas coisas entretanto se alteraram. Foi uma noite muito especial, porque estará sempre associada a momentos muito felizes.
Falar de públicos é falar de pessoas que de uma forma mais ou menos cómoda são também espectadores. Disseste, quando nos apareceste por casa, que não era essa a tua intenção. Um espectáculo repete-se invariavelmente, independentemente dos espectadores que a ele assistem. Tomaste as pessoas, nas suas variações e diferenças, como parte essencial daquilo que fizeste. E o que fizeste foi profundamente influenciado por elas. E que pessoas são essas? São pessoas que se conhecem e que combinam receber-te, a ti, desconhecido, num lugar privado e íntimo, e por isso diferentes do espectador que vai a um local assistir a um espectáculo, com outros estranhos, e que no final caminha para casa. Aqui invertem-se os papéis. Falar de pessoas é também falar de memórias e de afectos, e é isso que se explora aqui. Este encontro está invariavelmente preso a um local e a uma memória muito específicos. Está preso à luz de um tempo que passou, e que traz consigo esse rol infinito de memórias queridas a uma casa, a um lugar, a um grupo. Apesar das características imediatas desses momentos contigo — há um lado afectivo neste encontro combinado —, a tua matéria de trabalho (as pessoas) surge instantaneamente como essencial. Durante os primeiros momentos que passaste em nossa casa, lembro-me de ter pensado: "Mas ele não faz nada? Então mas onde está o espectáculo?". Era suposto fazeres alguma coisa, para que nós pudéssemos ver. Esta relação entre o que se faz e o que se vê não está retirada; na verdade, continua a existir. Tu és o centro de todas as nossas atenções, na medida em que não te conhecemos. Ao longo da noite, chega-se a uma conclusão: todos temos motivos para alguma comemoração, todos temos matéria para o espectáculo. E foi esse o motivo para os nossos brindes, que fizemos com o vinho que comprámos em conjunto no supermercado mais próximo. Estávamos entre amigos, e enquanto cozinhávamos, descobríamos pequenos nadas que nos ligavam. É algo que sempre fizemos: cozinhar e receber em casa aqueles de quem mais gostamos, e tu estavas connosco. Brevemente, foi assim. Não houve malabarismos, nem "espectáculo". Naturalmente esquecemo-nos que horas antes nos encontrávamos cheios de expectativas sobre o que iria conhecer. Tínhamos imaginado possíveis cenários, habituados que estávamos a situações semelhantes fora do nosso espaço. Há naturalmente representação, mas trata-se de meros efeitos momentâneos, que são desde logo apreendidos. A tua representação conheceu um momento exacto, uma situação muito particular, e foi nesse tempo, nessa representação única e que não se repete, que residiu toda a sua naturalidade. E isto foi um momento de festejo e de celebração: celebrámos a valorização da experiência e das distâncias entre as pessoas, num espaço e num tempo que se revelou muito importante para nós. Obrigada, Rogério.
Joana & Mariana, designers gráficas
[Caldas da Rainha, 2007]