RE-DEFINIÇÕES
por João Carneiro
Depois de assistir a um Vou A Tua Casa em casa de uma amiga, que terá inventado um nome ao telefone para que eu não soubesse quem era, o João escreveu o texto que se segue, publicado no suplemento Actual do jornal Expresso de 13 de Setembro de 2003. O título deste post é meu. O texto é este:
A proposta de teatro ao domicílio que Rogério Nuno Costa nos faz é mais um daqueles momentos que, no teatro português da última década (sobretudo) têm contribuído para redefinir a noção de teatro e, ainda, os limites a que a representação teatral pode chegar — limites nunca verdadeiramente definidos e sempre em mutação. Lúcia Sigalho e Mónica Calle são quem, de maneira mais radical e mais interessante, construiu “objectos dramáticos” que questionam os lugares habituais do teatro, mas creio que ainda não tinham ido, literalmente, a casa do público. O que Rogério Nuno Costa realmente faz em casa das pessoas, e só posso falar por uma experiência, é relativamente interessante, no seu conteúdo imediato: a encenação de uma visita, que é, também, um reconhecimento e uma recapitulação de uma relação anterior; uma adaptação, necessariamente, de um discurso artístico individual a um espaço desconhecido; uma reflexão sobre a cidade e sobre o exterior a partir daquela particular visita. O mais interessante, contudo, é a articulação destes conteúdos com a proposta que inverte certos parâmetros a que nos habituámos: sair de casa para ir ver um espectáculo, preservar a intimidade garantida pela condição de espectador. Curiosamente, Vou A Tua Casa quebra alguns dogmas mas continua a ser “um espectáculo” a partir do momento em que os papéis do espectador e do actor, ou os seus respectivos territórios, são redefinidos. Só por isso — mas não só — vale a pena telefonar a marcar hora.