Há pessoas que vão ter um bom espectáculo. Há pessoas que vão ter um mau espectáculo. Há pessoas que não vão ter espectáculo nenhum. Há pessoas que vão ter direito ao espectáculo todo, comme il faut. Isto é tão certo como 1 mais 1 ser 2, como é certo que na vida nem sempre as coisas correm de feição. Estaria a ir contra a razão de ser de todo o meu trabalho se fizesse o mesmo espectáculo para 30 pessoas diferentes. Não é possível. Nunca foi. Terá sido a pretensão de o fazer no ‘Lado A’ que me trouxe alguns dissabores e alguns espectáculos menos honestos. Decidi juntar-me ao monstro, em vez de o tentar combater. Não é possível criar um patamar de entendimento que permita a mesma eficácia perante qualquer circunstância, nomeadamente aquelas em que parece não existir qualquer ligação mais ‘emocional’ ao objecto. Se as circunstâncias não permitem, criem-se outras: paralelas, adversas, transversais, parodiantes, pedantes, pedintes, se for esse o caso... A performance acontece sempre, mesmo que eu desapareça dali. Acho que a coisa torna-se dolorosa para as duas partes. Mas trata-se de uma questão de justiça. É que para mim, público, actor, espectáculo, sítio, momento, dia, hora, coisas para dizer, coisas para guardar, etc., têm exactamente a mesma importância. Eu gostaria de poder levar o mundo a todas as pessoas que me telefonam, que me mandam e-mails, que se interessam. Mas a verdade é que nem todas o merecem: o mundo, o momento, o “espectáculo”, e etc... É preciso poupar nas nesgas de terra: nunca se sabe quando será necessário conceder um dia inteiro da minha vida a alguém, prescindir dos meus compromissos, entregar-me por completo, dar-lhe o ‘mundo’. Mesmo que seja o meu. Eu sei bem que isto tudo não me dá o prémio ACARTE, mas faz de mim um artista muito mais honesto.