quarta-feira, agosto 29, 2007

voxpop, #18.

EU NÃO VOU AO TEATRO...
por Luísa Casella


©Luísa Casella


…porque amo o teatro não vou. Porque não encontro o que já tive no teatro de forma única. Deixei de ir para não me angustiar: [não vêem que não é isto?]. Então o teatro veio a minha casa. Com o Rogério. Cinco anos de seca já haviam passado desde a minha última tentativa — um Hamlet que estrangulou a minha Ofélia com trejeitos de neurótica [não é nada disto, não vêem?]. O teatro veio a minha casa por causa da Ofélia, justamente, a minha Ofélia subaquática em infravermelho que o Rogério viu na exposição final do Ar.Co. Nessa altura estava ele [o Rogério] a fazer a sua Ophelia [é mesmo isto!]. Fizemos fotografias da Marina [tão linda a Marina!] debaixo de água, com flores de plástico que eu pintei de preto com tinta da China e que começaram a tingir a água das piscinas do Ateneu de roxo [ai, Luísa, ai ai]. Veio mais tarde a minha casa, ele, o Rogério, com o teatro que é ele mesmo: mais que teatro, mais que dança, mais que expressão — é a vida própria do Rogério [com 24 anos!, eu não podia acreditar…]. O Rogério gostou das minhas fotografias — fizemos o cartaz do Vou A Tua Casa, eu ainda não sabia o que era. Um dia foi a minha vez. Fui a tua casa, Rogério, ver. Ser o teu tu. E fotografar. No início pensei: "Não é nada disto, não percebo o teatro, é dança?, eu não sou deste grupo". Estava espectadora de fora — não sabia que nas tuas peças, Rogério, isso não se pode fazer. Não estamos de fora, somos o teu tu [que medo!, tens uma lata, Rogério!]. Foste-me puxando para dentro do teu mundo; na casa-de-banho deste-me uma chapada valente [eu a tentar trabalhar, fazer as fotografias, e tu a mandares-me bilhetinhos, a apontar-me os meus medos, os meus defeitos, a acusar-me de tudo o que fiz e não fiz para que o amor tivesse terminado — maldito sejas, Roger!]. Depois, no quarto, "Laisse-moi devenir, l’ombre de ton ombre, l’ombre de ta main, l’ombre de ton chien", já num pranto das vezes que quis ser a sombra do teu cão, enquanto ele queria ser a sombra da minha mão [maldito sejas, Rogério Nuno, eu só vim aqui para trabalhar, como posso fotografar através das lágrimas, homem?!]. Termina. Sais de casa. Pausa [o que é que eu tenho?, eu não estou bem de certeza!, deve ser algum esgotamento]. Voltaste com um sorriso. Eu disse que não estava à espera, que era muito forte. Tu disseste: "Não, tu é que estás muito sensível". Quando passaram quatro anos (que pena não serem 5, seria tão apropriado…) não voltei ao teatro.